Maldade de Escritório

A indústria química onde trabalhei tinha a época 40 % de seu capital controlado pela Bayer AG , os outros 60 % sob controle da Andrade Gutierrez . Como prerrogativa por sua participação no capital a Bayer detinha a indicação da vice-presidência , a diretoria comercial e a diretoria de produção .
O presidente a época da Bayer AG no Brasil era o Sr R.L. que também acumulava a vice-presidência da empresa onde eu trabalhava .
Figura fácil de se ver na empresa , onde comparecia sempre, era também figura constante nos jornais aparecendo em entrevistas e audiências com o então Ministro Delfum Neto , anunciando investimentos no Brasil , discutindo tarifas , etc .
Só que Leonardo não o conhecia .
Léo , recém admitido , mensageiro , estava na recepção do 18o andar substituindo Antônio , o porteiro , na hora do almoço naquele dia .
Saindo para o almoço abri a porta do andar no mesmo momento em que o elevador parava e dele descia o Sr R.L. . Com um leve aceno de cabeça retribuí o cumprimento do Sr. R.L. que imediatamente entrou .
Só não contava com a reação de Leonardo .
Este ao ver um senhor com cara de estrangeiro , de terno , desconhecido, sem crachá, entrando sem se anunciar ,saiu da mesa e foi atrás passando por mim como uma bala .
- Ei , Ei , aonde o Sr pensa que vai ?
Surpreso com a pergunta o Sr R.L. pára no corredor e, mais surpresos, ficamos eu e ele quando Léo o pega pelo braço e pede-lhe que retorne para ser anunciado .
Eu podia ter resolvido a situação na hora mas o sorriso de compreensão do Sr R.L. me calou . No fundo achei que queria ver como tudo se resolveria .
Léo o conduz até a mesa e lhe diz :
- O Sr. me perdoe mas as normas da empresa não permitem a entrada de desconhecidos. Com quem o Sr. quer falar ?
Sorrindo ainda, com extrema calma e gentileza , o Sr R.L. lhe diz :
- Eu vim ver o F., sou R.L. , temos uma reunião marcada no almoço.
- O Sr. quer dizer o Sr. H.F. nosso diretor comercial ?
- Sim , ele mesmo.
- Um minuto por favor que vou verificar se o Sr. H.F. pode lhe receber , ele é uma pessoa muito ocupada .
Léo disca o ramal da secretária do Sr H.F. , a Sra G.T., e avisa :
- Dona G. , tem um Sr. aqui na recepção , como é mesmo seu nome ...., Sr. L. querendo falar com o Sr F.
A resposta de G. o deixa desconfiado .
- O que ele está fazendo parado aí na recepção ? Porque ele não entrou direto ?
Desconfiado Léo aciona o botão que libera a trava da porta e pede que o Sr R.L. entre .
Após o Sr R.L entrar vira-se Léo então para mim e pergunta :
- Ely , você conhece este alemão ?
O capeta soprou no meu ouvido que podia então assustar Leonardo .
- Neguinho você só barrou o presidente da Bayer no Brasil , também vice-presidente desta empresa , um cara que toda hora é recebido pelo Ministro da Fazenda em Brasília .
Deu certo , a reação de Léo foi puro pânico .
- Ai meu Deus , será que ele ficou aborrecido ?
Disposto a jogar álcool na fogueira acrescentei :
- Não , nesta hora ele e o F. devem estar ligando para o Departamento Pessoal pedindo sua cabeça, o assunto está resolvido.
A reação chegou quase ao terror .
- Mas porque você não me avisou ?
- Léo, quando vi estava você pegando o homem pelo braço e o puxando pela portaria. Você não sabe que, no fundo mesmo, todo alemão é nazista e vai você, um neguinho de Caxias, puxar o cara pelo braço na maior intimidade ?
Se me metesse ao invés de um seriam agora dois os demitidos .
- Ai meu Deus , não tenho nem 3 meses de casa e acabei de comprar um armário duplex na Tele-Rio .
- Fica tranquilo Léo , a gente faz um vaquinha e te ajuda a pagar o restante das prestações.
O elevador pára e deixo um Léo resignado e infeliz na portaria .
Ao descer corro para o primeiro orelhão para esclarecer o assunto com o Sr R.L. e limpar a barra do pobre Leonardo.
A Sra G.T. atende o telefone e me tranquiliza .
- Ely , fica tranquilo , eles riram muito do acontecido e concordam que Léo agiu corretamente .
Saio tranquilo mas resolvo deixar Léo sofrer até minha volta .

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