Encontro com o Ladrão
Se me pedem uma definição digo que sou Carioca, Tijucano e Rubro-negro.
Acredito mesmo que os três qualificadores me definem em sua
essência.
Ser Tijucano significa gostar de cozinhas grandes, de
valorizar os encontros familiares,de achar que o Maracanã é seu , de gostar de
jogar conversa fora, de ir a pé até a padaria e
a banca de jornal, de passear com seus cães, de saber que está próximo
de tudo no Rio.
Sou do tempo da Tijuca de muito antes das UPPs , do bairro
cercado de favelas mas que não explodia em violência, onde o respeito aos
moradores e conhecidos era regra de lei.
Minha rua tinha um time que jogava sempre que podia nos
finais de semana. Já falei dele em caso que narrei em “Pelada na Quinta “. Disputávamos também os campeonatos que Padre
Jorge promovia na quadra da Igreja . Times de todas as favelas participavam
deste campeonato, assim era comum conhecer personagens que sabíamos adotar
outro comportamento fora da quadra mas que na Igreja se comportavam muito bem.
Tinha acabado de começar a namorar Leila e em uma noite de
sábado saímos no carro dela.
Ela havia entrado em casa, carro já guardado na garagem,
quando começo a descer a rua a caminho de casa.
Mais a frente, atrás de um poste, do outro lado da rua protegido por uma sombra vejo um sujeito
parado. São quase duas da manhã, não podia ser boa coisa.
Pensei imediatamente que seria assaltado.
Não adiantava
correr, se o sujeito estivesse armado seria pior. Resolvo esperar que me aborde , é quase do
meu tamanho, se estiver de mãos limpas não vai levar nada, vai ter que brigar
muito eu pensava.
Passo por ele do outro lado da rua e com o canto do olho
vejo que resolve atravessar para me encontrar por detrás .
Quando atravessa é iluminado pelas lâmpadas da rua e o
reconheço.
Já havíamos jogado contra o time dele uma dúzia de vezes, mais de
uma vez havia me filado cigarros depois do jogo e havíamos trocado algumas
palavras.
Desta vez a vantagem é minha, diminuo o passo e me viro na
hora em que parece buscar alguma coisa em suas costas. Digo em voz alta :
- E aí Bocão , tudo bom ?
Sua reação é de clara surpresa. Neste momento percebo que me
reconhece o que faz o trazer a mão detrás do corpo para a frente.
- O rapaz, tudo bom , e você , ainda joga no time do
Paulinho ?
- Claro, de vez em quando a gente se reúne . Minha namorada
mora nesta rua , estou indo para casa . E você o que está fazendo ?
- Eu ? Nada , tava ali parado pensando na vida .
- O Bocão , acho que você não me reconheceu e pensou que eu
era um mané qualquer. Tu ia me assaltar Bocão ?
- Claro que não , claro que eu te reconheci . O sorriso que
exibia era de um amarelo forçado.
- Pô Bocão , não se faz nada com quem é da área, você sabe
disso .
- Não é isso não, eu te reconheci.
- Então Bocão um abraço , vamos ver se jogamos outra vez.
- Vamos sim , tchau . Disse isto e deu a volta .
Desci a rua rindo, dessa vez a surpresa foi da “vítima “.
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